Thursday, February 23, 2006

As palavras saltam no ar, como bolas que brincam entre as mãos vazias de um malabarista.
As luzes do circo voltam a acender... Soam as primeiras gargalhadas, ao ver o homem nu passar. Despiu a própria pele. Olha à volta. Todos os corpos lhe parecem estranhos... E baila sobre a corda bamba. Olha a vida de cima. Cospe fogo, como quem atira palavras por cima das nuvens... E as palavras voltam, para dentro das bocas vazias.

Friday, February 17, 2006

Hoje não me apetece falar!... Quero saborear este silêncio.
Olha, vês aquela praia de areia vermelha? Não é a tua cidade preferida?

E as estrelas?... Ah!... Afinal são as luzes da tua cidade preferida.

Boa noite!... Bom dia!...
Olha aquele carro que se passeia pela praia... Não é o teu animal preferido?

Que fazes aí?... Mergulhas nessa silhueta solitária?

Já não ouves o sussurro de quem chama por ti?

Bom dia!... Boa noite!...

Acreditas na bola de cristal colorida?... Não parece um arco-íris de ilusão?
Talvez acredites nas cores que a vida ainda te pode dar...
Não as vês?... Como podes fechar os olhos quando o sol grita por ti?

Boa noite!... Bom dia!...

Queres parar o tempo?... Como o poderás fazer, se tens as mãos cheias de recordações?

O arco-íris escorre por entre os teus dedos... Não é a areia vermelha da tua praia preferida?

Quando as luzes da cidade se apagam, vejo uma estrela ascendente.

Bom dia!... Boa noite!...

Dorme!... Porque o dia acaba de acordar. Não o consegues ver?

Talvez seja aquele foco violeta que te cega o pensamento?...
Hum?... Que dizes?

Não falas mais nada?... Então, DORME!...

Boa noite!... Bom dia!...

[Hoje apeteceu-me voltar a este texto... E apeteceu-me voltar a trazê-lo para a frente... Para voltar a ser lido... E saboreado... Por quem for apreciador(a) de lugares de sonho... Como os sonhos que povoam o meu imaginário. Estrelas de beijos... Boa noite!... Até logo.]

«Acariciar é viajar pela superfície, reconhecer um tamanho e a forma, aceitar o mundo como forma ou dar-lhe uma outra forma: esculpi-lo. A nossa forma aceita as outras formas, entrelaça-se com elas, forma um único corpo com o mundo. Acariciar é estar reconciliado com nós próprios.»

["MAIS QUE ERÓTICO: SADE"; Octavio Paz; Difel - Difusão Editorial, S. A.]

Wednesday, February 15, 2006

Num mar de afectos repousa a estrela de mil braços... Das profundezas escuras, onde mil vidas se cruzam, lança os seus tentáculos... Na esperança de sentir o espaço encher-se de outras tantas águas. A estrela permanece, à espera de vez. E vê todas aquelas vidas a passar. Um dia, as águas haverão de deixar escorregar outro corpo... E os mares encher-se-ão em novas vagas de afectos, onde a dor será uma ténue recordação... Do passado abandonado. Um novo tempo embala a estrela. Águas vão, águas vêm... Mas há um sentir que não se dilui.

Friday, February 10, 2006

«Flutuo calmamente
Sem nenhum som
Para sempre, até ao fim dos tempos
E vejo-me ainda estendida na cena do crime
Ainda estendida na cena do crime

Como sangue no corpo
Como vento na água
Passei para o mar de luz
Segue-me até ao mar de luz

O mar de luz

O milagre sai do limite do arco-íris
Deixa a chuva cair, deixa-a descer
Cavalgando no rio de estrelas
Os céus abrem-se, no final do túnel»

["Sea Of Light"; Siouxsie & The Banshees]
O sopro da manhã canta-me um dia novo. Os telhados dourados iluminam os meus olhos... Vejo através de casas de sentido que os meus sentidos estão para além das casas. Vagueio por ruas ancestrais, rumo ao começo de tudo. Abro-me aos cheiros da manhã e caminho mais lentamente. Quero saborear este momento... Passar por ele como ave que poisa em ramo verde. O meu pensamento abandona-me e caminha à velocidade da luz. Não o consigo seguir. Não me apetece correr atrás do pensamento, atrás de um tempo que se escapa por entre penas que pairam no vazio. Se voltar a acordar, quero abraçar o dia... Sentir cheiros, cores e sabores... Embalar-me no sentido de ter sentidos... E cantar uma nova vida... Cheia... Tremendamente transbordante.

Tuesday, February 07, 2006

«A pura felicidade está no instante, mas a dor expulsou-me do instante presente, para a espera do instante futuro em que a minha dor será acalmada. Se a dor não me tivesse separado do instante presente, a "pura felicidade" estaria em mim. Mas agora, falo. Em mim, a linguagem é o efeito da dor, da necessidade que me amarra ao trabalho.»

[«A Felicidade, o Erotismo e a Literatura - Ensaios 1944-1961»; Georges Bataille; Adriana Hidalgo Editora]

Saturday, February 04, 2006


O dia D está a chegar...
Dia 8... Dia de Depeche Mode.
Não sei se valerá a pena... Mas já sinto uma estranha forma de prazer a estalar-me nas veias. Às vezes somos traídos pelas expectativas... Por isso tenho medo delas. Mas, ainda assim, espero ansiosamente por este dia D... Sobretudo agora, que está perto. Até dia 8, no sítio que, podendo não ser o mais adequado, será a catedral de um cerimonial que se espera singular.

Thursday, February 02, 2006

A gravidade é uma força que me atrai... Que envolve o corpo. Gosto de sons graves, que nos ligam à terra e nos fazem aquecer a pele. Gosto de vozes melodiosas, que carregam as rugas do tempo. Gosto do soar do batuque dos tambores, que nos convidam à festa. Hoje celebro a chegada das chuvas de Fevereiro. E deixo o corpo fluir ao som dos batuques, das vozes graves, da chuva a cair.
«Vou num rio pró mar e eu já fui rio
E o que já fui ainda sou agora
Como fui água nunca sinto frio

Porque fui mar nunca me vou embora

Vou sendo ar a revelar sementes
E beijo nuvens como sendo irmãs
Levada pelas brisas ascendentes
Respiro o céu de todas as manhãs

Filha do sol, do fogo e da saudade
Vou sendo as vidas a que Deus me deu
E ao ir nesse fluir da Eternidade
De fogo e sol eu visto as cores do céu

Mas por ter sido pedra rocha e mar
Sinto nas pedras o meu ser vazio
E agora como Deus me deu sonhar
Sonho ser pedra… Rocha e vou num rio»

[Vou num Rio; In “Da Minha Voz” de Né Ladeiras; Letra de Tiago Torres da Silva]